“Tenho a oportunidade de recuperar o meu ano perdido”

Ao se mudar para Boa Vista, Emilly não conseguiu uma vaga e ficou um ano fora da escola. No ano seguinte, ela teve a chance de retomar a aprendizagem

UNICEF Brasil
uma adolescente está em sala de aula lendo um papel
UNICEF/BRZ/João Laet
07 janeiro 2021

* Fotos tiradas antes do início da pandemia de Covid-19.

Quando Emilly da Silva se mudou do município de Amajari, no interior de Roraima, para a capital Boa Vista, já era início de ano letivo. Era o ano de 2018, ela iria para o 6º ano do ensino fundamental, e estava animada com a volta às aulas. Mas, ao chegar à cidade, um susto: o pai e a avó, com quem morava, tentaram conseguir vagas nas escolas mais próximas à sua casa e não tiveram sucesso. Emilly ficou um ano inteiro sem estudar, o que acabou prejudicando a sua trajetória escolar.

A situação melhorou apenas no ano letivo seguinte, quando a menina foi direcionada para a Escola Estadual Buriti, uma das selecionadas pela Secretaria de Educação do estado para implementação da estratégia do UNICEF Trajetórias de Sucesso Escolar. Isso porque a Buriti oferece uma nova oportunidade para estudantes que estão em distorção idade-série: a correção de fluxo. Agora, aos 14 anos, Emilly cursa o 8º e o 9º ano do ensino fundamental para corrigir o seu ano de atraso. A oportunidade, alinhada à sua dedicação, teve um bom resultado, e já faz a adolescente sonhar com o ensino médio.

uma adolescente caminha segurando livros escolares
UNICEF/BRZ/João Laet

De volta ao caminho de sucesso
Durante todo o ano de 2018, a menina ficou sem poder ir à escola. Mas, com a inquietude de não estar estudando, decidiu tomar uma atitude: começou a estudar sozinha. “Eu sempre tirava um tempo para estudar. Eu pegava o caderno, lia um texto e respondia às perguntas que conseguia na internet”, conta.

Emilly passou a usar recursos online e livros para seguir com seus estudos, mesmo sozinha. “Foi uma ideia minha fazer isso, pra eu poder começar bem na escola no ano seguinte. E foi muito importante pra mim”, diz. Apesar do ânimo de seguir lutando pelo seu direito de aprender, o fato de ter atrasado um ano em sua trajetória escolar a entristecia. Ficar fora da escola era de longe a situação ideal para a adolescente. “O que eu mais sentia falta era do professor explicando, passando as atividades. Eu sentia muita saudade de escrever, de fazer amizades”, lembra.

Já com um ano em atraso, nem Emilly nem sua família perderam tempo. Em 2019, no momento de matrícula, a menina foi direcionada à Escola Estadual Buriti, para que pudesse cursar duas séries ao mesmo tempo. Apesar de um pouco mais distante de sua casa, Emilly se animou com a possibilidade de cursar o ano que perdeu junto com o ano em que deveria estar. Então, aos 13 anos, entrou para a turma que reúne o 6º e o 7º ano.

E o ano letivo foi um sucesso. “Eu fiquei muito feliz quando recebi a notícia de que fui aprovada, e isso me animou a continuar na mesma escola para também cursar o 8º e 9º juntos, e ir pro ensino médio no ano seguinte”. Isso quer dizer que Emilly já não estará em atraso escolar e entra com a idade certa para a sua próxima etapa escolar.

A expectativa de avançar é o que a motiva a pedalar por 30 minutos todos os dias até a escola. “Aqui eu encontrei a oportunidade de recuperar meu ano perdido e ainda cursar o ano em que eu deveria estar”, diz, com um sorriso no rosto.

uma adolescente caminha no corredor da escola ao lado de uma professora. elas estão conversando.
UNICEF/BRZ/João Laet

Por mais histórias de sucesso
Foi há cerca de quatro anos que a escola de Emilly passou a trabalhar com as turmas de correção de fluxo. O começo não foi fácil: a escola recebeu alunos em atraso escolar de diversos bairros da cidade, alguns distantes, cada um com uma história de reprovação e necessidades de aprendizado diferentes, mas ainda não sabia lidar com isso.

A orientadora pedagógica Aldamires Melo, relembrando, conta que foi um grande momento de transição para os professores que começariam a dar aulas para a turma de correção de fluxo. Eles precisariam de uma nova forma de ensino em sala de aula, para selecionar e aplicar os conteúdos com sucesso. “A implementação dessas séries foi difícil e turbulenta, mas com o passar dos anos fomos aprendendo a lidar e compreender o planejamento de fazer duas séries ao mesmo tempo”, conta Aldamires.

Atualmente, a Escola Estadual Buriti já é considerada uma escola de referência para atender alunos em atraso escolar, e possui quase metade das turmas apenas destinadas à correção de fluxo. Dos cerca de 320 alunos da escola, 150 estão cursando duas séries ao mesmo tempo.

Por isso, a Buriti, junto com outras quatro escolas, foi selecionada como parte do projeto piloto da Secretaria de Educação de Roraima para implementar a estratégia Trajetórias de Sucesso Escolar, em parceria com o UNICEF. O objetivo é oferecer às escolas do estado um conjunto de recomendações para o desenvolvimento de políticas educacionais que promovam o acesso, permanência e aprendizagem dos estudantes em atraso. Entre elas, formações especificas voltadas aos professores da correção de fluxo buscam capacitá-los para as necessidades metodológicas das turmas.

Aldamires comemora essa nova etapa de formação, algo que considera que faltava em anos anteriores. Para ela, é importante que esses educadores comecem a ter um olhar diferente, para além do aprendizado em sala de aula, buscando entender a particularidade de cada aluno. Agora, com o apoio do UNICEF, a Secretaria Estadual de Educação busca aumentar os esforços para capacitar as equipes gestoras das escolas, garantindo histórias de sucesso para cada vez mais estudantes.