O primeiro emprego dos sonhos

Após monografia sobre atendimento a pessoas que vivem com HIV/aids, assistente social participa do Viva Melhor Sabendo Jovem em Vitória

UNICEF Brasil
21 julho 2020
Após monografia sobre atendimento a pessoas que vivem com HIV/aids, assistente social participa do Viva Melhor Sabendo Jovem em Vitória. Contratada como assistente de coordenação, passou por duas semanas de treinamento oferecido pela Associação Gold e pelo UNICEF. Na foto, um grupo de adolescentes e jovens olha para a câmera. Eles usam camiseta do projeto Viva Melhor Sabendo Jovem e estão sorrindo
Associação Gold
Izabela, em primeiro plano (à direita), foi assistente de coordenação de uma equipe diversa do projeto Viva Melhor Sabendo Jovem em Vitória, no Espírito Santo.

Meses antes de completar 15 anos, Izabela teve uma aula em casa. Aprendeu a andar de salto alto, coisa que nunca precisou fazer até aquele momento. O professor foi o tio Marcelo, uma das pessoas mais importantes de sua vida. Ele também a ajudou a escolher a roupa da festa, e a pensar em um penteado que valorizasse seus lindos cachos. Quando o grande dia chegou, Negão, como a sobrinha o chamava, não estava lá.

“Ele era como um irmão mais velho, morávamos juntos, um homem extraordinário, negro, gay, referência de militância pra mim”, conta Izabela Maria Martins da Silva. O tio amado morreu pouco tempo antes da festa tão esperada, em decorrência do HIV/aids. Tinha 39 anos. “Cresci sabendo o que ele passava, como era o tratamento. Toda a minha vida ele esteve junto. Sinto que continua até hoje”.

A experiência ao lado de alguém tão presente ajudou Izabela a escolher seus próximos passos. Ela estudou serviço social e, em 2018, defendeu seu trabalho de conclusão de curso, em parceria com uma amiga da faculdade: ela pesquisou o atendimento a pessoas vivendo com HIV/aids e sua inserção na política estadual de saúde.

Surgiu então a oportunidade de trabalhar com o tema que marcou com tanto significado sua vida. Ela entrou para a equipe do projeto Viva Melhor Sabendo Jovem, realizado pelo UNICEF e a Associação Gold, em parceria com a Prefeitura de Vitória e a Secretaria Estadual de Saúde do Espírito Santo. Durante nove meses, o projeto buscou prevenir HIV/aids e outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) entre adolescentes e jovens na capital capixaba, além de promover a testagem rápida e o acesso ao atendimento adequado de saúde de novos casos.

Embora tivesse o perfil mais do que desejado para entrar na equipe do Viva Melhor Sabendo Jovem Vitória, a jovem de 24 anos não se via merecedora. Estava desanimada com tentativas frustradas de conseguir o primeiro emprego. “Confesso que pensei ser mais um que tentaria sem conseguir”, recorda. “Na semana seguinte à entrevista, uma sexta-feira à noite, recebi uma mensagem perguntando se estava pronta para começar na segunda”.

Contratada como assistente de coordenação, passou por duas semanas de treinamento oferecido pela Associação Gold e pelo UNICEF sobre direitos humanos, infecções sexualmente transmissíveis, violência contra a mulher. Aprofundou seus estudos de anos. E foi quando começaram as amizades da equipe que tinha a diversidade como marca, e também o desejo de fazer do Brasil um lugar melhor.

“Entrei com muito medo. Mas o projeto trabalhou minha autoestima. Fiz amigos. Dividíamos angústias e dificuldades”, lembra Izabela, com gratidão. Foi uma construção, um aprendizado diário entre pessoas diferentes, com idades diferentes.

Foram sete meses de trabalho – e deu tudo certo. A equipe realizou um total de 940 testes de HIV/aids, sífilis, hepatites B e C nas ruas de Vitória. As angústias de Izabela, naturais para uma jovem em seu primeiro emprego, foram superadas uma a uma.

“É incrível, quem testa negativo começa a pensar numa outra vida, a se ver de outra forma. Como se fosse uma segunda chance. Ainda existe um tabu de o homem e a mulher irem a uma unidade de saúde em busca de preservativos, por exemplo. As pessoas que passam pelo projeto são tocadas de alguma forma”, reflete Izabela.

Seu sonho profissional é seguir a carreira escolhida, como assistente social, e da qual se orgulha. “Fiz o Enem com muita vontade. Sempre defendi minha carreira, nunca liguei pra opinião dos outros, não me importa a desvalorização, o baixo salário. Quero continuar trabalhando com pessoas que vivem com HIV, como o tio Marcelo”, ela diz. E, assim, os dois continuam juntos.