Casamento prematuro em Moçambique
Moçambique tem uma das taxas mais elevadas de casamento prematuro do mundo

- Português
- English
Moçambique tem uma das taxas mais elevadas de casamento prematuro do mundo, afectando quase uma em cada duas raparigas, e tem a segunda maior taxa na sub-região da África Oriental e Austral. Cerca de 48 por cento das mulheres em Moçambique com idades entre os 20 e os 24 anos já foram casadas ou estiveram numa união antes dos 18 anos e 14 por cento antes dos 15 anos (IDS, 2011).

O Casamento prematuro põe em perigo as raparigas. Raparigas casadas sofrem maiores abusos, violência doméstica (incluindo abuso físico, sexual ou psicológica) e abandono.
Como UNICEF trabalha para acabar com o casamento prematuro
Pôr termo à violência contra as crianças e o casamento prematuro é prioridade do UNICEF. Existe uma grande necessidade de sensibilizar as comunidades sobre a prevalência do abuso e da violência, bem como capacitar os membros da comunidade, as famílias e as crianças para que denunciem e resolvam tais violações. Os sistemas de protecção da criança a todos os níveis, nas comunidades e em todo o país serão apoiados para providenciar uma resposta efectiva.
Uma das principais áreas de apoio é a colaboração multissectorial entre o governo e a sociedade civil para prevenir e combater a violência contra as crianças, o casamento prematuro e outras práticas prejudiciais.
Abordar a violência contra as crianças e transformar as normas e práticas sociais que são potencialmente prejudiciais para as crianças requer o envolvimento e a colaboração de uma ampla gama de actores diversos, incluindo ministérios, actores do sistema de justiça, sociedade civil, líderes tradicionais e religiosos, órgãos de informação, juventude e adolescentes. O UNICEF apoiará o estabelecimento e/ou o fortalecimento de mecanismos de coordenação multi-sectoriais a nível nacional e nas províncias alvo para implementar a Estratégia Nacional de Prevenção e Eliminação do Casamento Prematuro e responder efectivamente à violência contra as crianças.
Clique aqui para ler mais sobre o programa do UNICEF para a Protecção da Criança
A história do casamento prematuro da Mariamo
Angoche, NAMPULA - “Depois de ter feito os ritos de iniciação*, os meus pais me aconselharam a casar. Eles disseram que eu teria uma vida melhor, que o meu marido iria dar-me tudo o que eu quisesse. Eu queria obedecer aos meus pais, e então casei-me. Eu tinha 14 anos,” diz Mariamo Omar Ambasse Age, de 17 anos de idade.
Mariamo nasceu no distrito de Angoche, na província de Nampula. Vive numa comunidade pequena, a casa é de construção precária e quando chove a água da chuva entra dentro de sua casa. Tem uma família grande, composta por 3 irmãos e 3 irmãs. Mariamo é a menina mais nova da família. Os seus pais sobrevivem da agricultura e pesca, a sua mãe trabalha numa “machamba” familiar e o seu pai é pescador.
Mariamo gosta muito de estudar, e sonha em ser uma advogada, sonho este que foi interrompido quando frequentava a 10ª classe, quando os seus pais a convenceram a casar-se com um homem de 36 anos com a perspectiva de melhorar a sua vida e da família.
“Eu pensava que fosse ter uma vida melhor depois de casar, que não ia faltar comida, mas havia dias que não tinha o que comer e nem sabia o que iria comer no dia seguinte. O meu marido não me disse para parar de estudar, mas fui obrigada a deixar a escola para poder trabalhar e ajudar a sustentar-nos. Eu vendia amendoim na rua e com o pouco dinheiro comprava comida,” lembra Mariamo do tempo em que era casada.
Certo dia Mariamo escutou na Rádio Comunitária de Parapato um programa sobre casamentos prematuros. “Eu não sabia o que eram casamentos prematuros, não sabia que eu estava num. Ao escutar na rádio eu soube que era errado, e o que fazer para sair do meu casamento”.
Mariamo decidiu contactar a responsável do programa de rádio e contou a sua história, “a senhora Arminda da rádio perguntou-me se eu queria sair do meu casamento, e eu disse que sim, porque queria voltar a estudar.” A rádio levou a Mariamo ao Gabinete de Atendimento da Mulher e da Criança em Angoche e chamou os seus pais. “Perguntaram aos meus pais o que eles ganharam em casar-me criança, e os meus pais disseram que não tiveram benefícios, só queriam que eu vivesse uma vida melhor, não sabiam que ia sofrer. Eles disseram que estavam arrependidos e gostariam de me ver de volta à escola.”
A Rádio Parapato e o Gabinete ajudaram Mariamo a sair do seu casamento e a voltar à escola, deram-lhe também material escolar porque os seus pais não tinham condições.
Hoje Mariamo está a concluir a 11ª classe, e quer ser advogada. “Quero ser advogada para poder ajudar as crianças a defender os direitos delas, e evitar que outras meninas passem pelo que eu passei, porque já estou cansada de injustiça.”
A Rádio Parapato ajudou 7 meninas a saírem de casamentos prematuros e a sonhar com um futuro melhor. O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) tem apoiado, através do Fórum Nacional de Rádios Comunitárias (FORCOM) e do Instituto de Comunicação Social (ICS), na produção de programas radiofónicos semanais em Português e nas línguas nacionais em cerca de 60 rádios comunitárias, incluindo a Rádio Parapato. O UNICEF também apoia na produção de programas de rádio de Criança-para-Criança, que são programas de rádio concebidos e produzidos por crianças para crianças, plataformas importantes para a participação e engajamento delas.
“Eu acho um pesadelo casar enquanto criança. Para as meninas que estão casadas, eu peço que não deixem de lutar pelos seus sonhos, peçam ajuda e saiam do vosso casamento. Não abandonem a vossa educação, o vosso futuro depende dos estudos. Quero agradecer a Rádio Parapato por ter-me ajudado a voltar a sonhar,” concluiu Mariamo com um olhar determinado.

As raparigas casadas muito novas geralmente vêm de famílias mais pobres e uma vez casadas tem maior propensão a continuarem a viver na pobreza.
Mensagens chaves sobre o casamento prematuro

O casamento prematuro expõe as raparigas a vários abusos

O casamento prematuro expõe as raparigas a doenças graves como HIV/SIDA e fístula obstétrica, e aumenta a mortalidade maternal e infantil

O casamento prematuro tira as raparigas da escola antes do tempo
Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras
O Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, promulgou em outubro de 2019, e mandou publicar a Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras, aprovada em julho 2019 pelo parlamento. A lei elimina uniões maritais envolvendo pessoas com menos de 18 anos, punindo com pena até 12 anos e multa até 2 anos o adulto que se casar com uma criança.
- "O adulto, independentemente do seu estado civil, que unir-se com a criança será punido com pena de prisão de 8 a 12 anos e multa até dois anos" - Artigo 30, Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras em Moçambique.
- "A união entre duas pessoas formada com propósito imediato de constituir família, só é permitida a quem tiver completado 18 anos de idade à data da união" - Artigo 7, Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras em Moçambique.
- "O adulto que, por si ou por interposta pessoa, noivar uma criança conhecendo a idade desta, será punido com pena de prisão até 2 anos" - Artigo 25, Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras em Moçambique.
- "O servidor público que, no exercício das suas funções, de forma consciente, celebrar ou autorizar a celebração de casamento no qual ambos ou um dos esposados é criança, será punido com pena de prisão de 2 a 8 anos e multa até 2 anos" - Artigo 26, Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras em Moçambique.
- "Aquele que colaborar para que a união com uma criança tenha lugar, ou que por qualquer outra forma concorra para que produzam os seus efeitos, desde que tenha conhecimento de que a união envolve criança, será punido com pena de prisão e multa até 1 ano" - Artigo 31, Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras em Moçambique.
- "A pena de prisão de 8 a 12 será aplicada a quem entregar criança para união em troca de algum bem ou valor, para pagamento de dívida, como cumprimento de promessa, como dádiva ou para qualquer outra finalidade contrária à lei" - Artigo 32, Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras em Moçambique.
- "O pai, a mãe, o tutor, o padrasto, a madrasta, qualquer outro parente, encarregado de guarda da criança ou da sua educação, ou a pessoa que exercer poder equiparável ao parental ou de guarda, que autorizar ou obtiver autorização para união de criança, instigar, aliciar ou não obstar a união, será punido com pena de prisão de 2 a 8 anos e multa até 2 anos, se pena mais grave não couber" - Artigo 33, Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras em Moçambique.
Vamos juntos fazer conhecer esta importante lei nas comunidades e nas zonas mais afectadas e acima de tudo criar condições para a sua divulgação por todo Moçambique.