Inclusão social
Para cada criança, inclusão

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Situação na inclusão social
Moçambique ficou entre as primeiras 10 economias de crescimento mais rápido do mundo até muito recentemente, mas agora enfrenta uma grave crise financeira e continua a ser um dos países mais pobres e menos desenvolvidos do mundo. A taxa de crescimento económico médio anual da década passada de 7,5 por cento não conseguiu proporcionar um progresso equitativo.
Por um lado, as descobertas recentes de recursos naturais, particularmente o gás líquido, suscitaram esperanças de uma mudança de rumo e por outro lado suscitaram preocupações com a chamada “maldição dos recursos”, que poderia não criar postos de trabalho, ter um impacto negativo na taxa de câmbio e custo de vida e principalmente promover o surgimento de uma pequena elite.
De acordo com os dados preliminares do último Inquérito ao Orçamento Familiar (IOF 2015), a maior parte do crescimento do consumo doméstico ocorreu no quintil mais rico, com o quinto mais rico dos moçambicanos a gastar 14 vezes mais que o quinto mais pobre; este é o dobro do rácio de 7 por 1 há apenas seis anos.
A pobreza geral de consumo é de 46 por cento. Persistem as disparidades no acesso e uso de serviços – e mais importante ainda dos resultados – entre as zonas rurais e urbanas, sul e norte do país, rapazes e raparigas e entre os diferentes quintis de riqueza. Em algumas províncias, a pobreza ultrapassa os 50 por cento das famílias (Gaza – 51 por cento, Zambézia e Nampula – 57 por cento e Niassa – 61 por cento), enquanto na cidade de Maputo a taxa caiu para 11 por cento, mostrando que o crescimento no passado fez-se sentir apenas na capital. Os dados mais recentes indicam que mais de 50 por cento das famílias são afectadas pela insegurança alimentar, 24 por cento cronicamente, deixando-as vulneráveis a choques – tais como inundações recorrentes por todo o país e seca no sul e no centro – e prejudicando a sua produtividade. A desnutrição continua a ser um factor determinante fundamental para o subdesenvolvimento infantil, com 43,3% das crianças desnutridas. Depois de muitos anos focados no acesso aos serviços, é claro que a qualidade e a equidade são elos fundamentais em falta na prestação de serviços.
Prioridades do programa 2017–2020
Apoiar a inclusão social exige que se olhe tanto para aqueles que são excluídos como para os agentes e processos de decisão que mantêm um sistema de desigualdade. O programa baseia-se numa estrutura que promove a inovação de políticas com base na produção de evidências, envolvimento com os principais actores e avaliação dos resultados, promovendo deste modo processos de busca e implementação de soluções que funcionem.
As principais áreas de apoio são:

Realização de pesquisa, análise e avaliação de qualidade em múltiplas dimensões da pobreza e privações infantis para informar as políticas e estratégias para um desenvolvimento inclusivo e equitativo.
O foco é incentivar políticas baseadas em estratégias de desenvolvimento em prol dos pobres.

Promoção do investimento equitativo centrado na criança através de planos nacionais, orçamentos e legislação.
O UNICEF produz informações fundamentais para influenciar os planos e orçamentos nacionais em diferentes estágios do ciclo orçamental e interage com os principais actores que influenciam directa e indirectamente essas políticas e processos. Ao trabalhar com o Ministério da Economia e Finanças (MEF), a Assembleia da República e a sociedade civil, bem como com instituições financeiras internacionais (IFI) e doadores, o UNICEF promove o fortalecimento da transparência, participação e fiscalização dos processos orçamentais, a fim de influenciar recursos que promovam a redução da pobreza e a equidade nos resultados para as crianças. O trabalho inclui a publicação de estudos (por exemplo, análise de custos e do espaço fiscal e critérios de alocação do orçamento territorial), informes orçamentais, brochuras de alfabetização orçamental, assistência técnica ao MEF e à Assembleia da República, capacitação e apoio às organizações da sociedade civil que trabalham em torno de assuntos ligados às finanças públicas e iniciativas que reúnem uma série de intervenientes do processo orçamental com o propósito de aumentar o diálogo político. Ao longo da última década, o trabalho do UNICEF nesta área levou à definição de uma estratégia integrada de geração e partilha de informações sobre finanças públicas que posicionou o UNICEF Moçambique como um actor relevante a nível nacional, considerado um padrão de ouro na região.

Utilização de dados e recurso à participação dos cidadãos para informar os planos e orçamentos do Governo eficazes a nível nacional, provincial e distrital.
Esta medida fortalecerá o processo de descentralização e os sistemas de governação local para melhorar a prestação de serviços. O UNICEF apoia o Plano Quinquenal do Governo (PQG) sobre a governação local, defendendo a governação participativa e inclusiva; a continuação da transferência de poderes; delegação das funções e recursos do Estado às autoridades locais; e reforço da participação do cidadão na tomada de decisões de desenvolvimento a nível dos distritos e das autoridades locais. Também contribui para o foco do Objectivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) no aprimoramento da urbanização inclusiva e sustentável. O UNICEF também incentiva vínculos económicos, sociais e ambientais positivos entre as zonas urbanas, peri-urbanas e rurais através do fortalecimento da planificação de desenvolvimento nacional e regional.

Recolha de evidências sobre a eficiência e a eficácia para informar a ampliação e o investimento em sistemas e políticas de protecção social sustentável.
Pesquisas e evidências contribuirão para garantir a equidade e a não discriminação na identificação dos beneficiários e para minimizar os erros de inclusão e exclusão que tornem o sistema ineficiente. Também apoiará a advocacia com vista a melhorar o investimento no fornecimento de intervenções de protecção social; a inclusão de outros sectores, tais como a nutrição, a educação e a saúde no diálogo sobre políticas; e produção de evidências sobre a eficácia dos programas de protecção social para reduzir as vulnerabilidades e diminuir as desigualdades. A protecção social consiste num conjunto de políticas e programas sectoriais e, por conseguinte, é uma área em que todas as áreas de resultados do programa do país devem poder interagir, sob a coordenação e orientação das funções de política social.
Onde vai o dinheiro
Distribuição do Orçamento Nacional: Sectores sociais no orçamento geral, 2017

Alocação de Recursos: Orçamento do UNICEF vs. Orçamento Social em USD

A maioria dos investimentos em serviços sociais para as crianças e suas famílias são financiados pelo governo nacional. Portanto, a mobilização dos recursos próprios do governo, que são infinitamente superiores aos do UNICEF, tem o grande potencial de fazer a diferença para as crianças. Como um governo gera receitas e decide gastar os seus recursos é uma decisão técnica e política que tem enormes consequências para as crianças. O objectivo em última instância do trabalho do UNICEF nesta área é garantir que os direitos de todas as crianças em Moçambique sejam realizados através de planos e orçamentos nacionais que sejam efectivos e que promovam a equidade para os sectores sociais que servem o bem-estar das crianças.
Enfrentando a pobreza multidimensional e as desigualdades

O amor que Sara, de 12 anos, tem pela sua avó frágil e idosa brilha através dos seus olhos e sorriso encantador ao observar a sua avó a decidir se deve ou não tirar o lenço para uma foto.
“Eu quero ser médica quando sair da escola”, diz Sara com a determinação de alguém que acredita que pode fazê-lo. “Admiro os médicos quando os vejo melhorar as pessoas. Eu quero fazer a mesma coisa.”
No entanto, esse sonho foi quase desfeito há 10 meses quando o tio rasgou os seus livros escolares. Sem livros, Sara desistiu da escola, perdendo três meses de aulas até Raul Paqueleque, membro do comité de saúde e secretário do conselho de escola, visitar a sua casa. “Sara disse-me que queria ir à escola, mas não tinha livros”, diz Paqueleque. Ele assegurou-lhe que poderia regressar e contactou o conselho de escola local que organizou novos livros para Sara, usando o dinheiro reservado na escola para crianças vulneráveis.
Sara está entre as mais vulneráveis na sua aldeia rural pouco povoada no distrito de Mucocola, Muecate, a cerca de duas horas de carro da capital provincial da província de Nampula, uma das províncias mais populosas com alguns dos piores indicadores sociais, em particular no que se refere às raparigas. A casa dela está localizada numa zona remota a cerca de 10 quilómetros de distância ao longo de uma estrada de terra batida.
A mãe da Sara mandou-a recentemente para a localidade para cuidar da avó; os outros três irmãos e irmãs ainda vivem com a mãe a sete quilómetros de distância.
Carlos Armando, membro do comité de protecção da criança a nível distrital, sublinha que a avó de Sara tem apenas uma pequena machamba de amendoim, milho, mandioca e feijão, que Sara cultiva, e a pensão da avó, a única renda da família, é inferior a US$ 50 por mês.

De 1.000.000 foi aproximadamente o aumento do número de pessoas pobres no país, entre 2008/09 e 2014/15 apesar da redução da pobreza em
termos percentuais.
Sara aceita a sua realidade e está encantada com a ideia de voltar à escola; ela já está na 7ª classe do ensino primário. Sara descreve as tarefas diárias que realiza sozinha antes e depois da escola, sem qualquer sinal de ressentimento. Sorrindo, ela diz: “Eu levanto-me antes do sol nascer para trabalhar.” As tarefas dela incluem limpeza, trabalho na machamba, preparação da comida, ir buscar água e cuidar da sua avó idosa. Ela reconhece: “Ir procurar lenha é difícil para mim porque tenho medo quando vou sozinha para o mato.” Elas não têm electricidade, água canalizada nem casa de banho.
O Especialista Sénior em Política Social do UNICEF em Moçambique, Andrea Rossi, destaca que as crianças que vivem na pobreza, como é o caso de Sara, são privadas de múltiplos aspectos das suas vidas, nomeadamente educação, saúde, nutrição, água, saneamento, abrigo e protecção. Para muitos, estas privações chegam a sobrepor-se. Por esta razão, em 2016 o UNICEF apoiou a pesquisa não só sobre a pobreza monetária, mas também sobre a pobreza multidimensional, como é a situação da Sara, e orientou análises aprofundadas das alocações de finanças públicas e despesas do governo em sectores sociais. “Se não podemos reduzir a pobreza a curto prazo, devemos pelo menos reduzir a privação de serviços básicos nas áreas da saúde, educação, água, saneamento e protecção. Mesmo sob severas restrições económicas, precisamos trabalhar juntos para garantir que o governo mobilize ao máximo os recursos que tem disponíveis e maximize o impacto para as crianças, especialmente para as que são mais marginalizadas e carenciadas, que vivem principalmente nas zonas rurais e remotas.”
O rico tornou-se mais rico. Em 2008 a pessoa no quintil mais rico consumia 7 vezes mais que a pessoa no quintil mais pobre. Em 2015 a diferença era de 14 vezes mais.

Consumo mensal per capita do quintil mais rico (Meticais, preços actuais)
Fonte: IOF data , 2008/09 vs 2014/15

Um relance sobre a inclusão social em Moçambique
Crescimento económico médio | 7,5% |
Pobreza geral | 46% |
População infantil | 12 milhões |
Crianças que vivem na pobreza absoluta | 48% |
Famílias afectadas pela insegurança alimentar | acima de 50% |
Fonte: UNICEF, Child Poverty and Disparities