“As pessoas aqui não têm dinheiro para comprar itens de higiene”
Vivendo em ocupações informais em Roraima, 2,5 mil migrantes e refugiados da Venezuela receberam kits com itens de higiene, distribuídos pelo UNICEF, para prevenção e combate ao coronavírus

Há apenas três meses, já grávida, Luzmary Pereira chegou ao Brasil um pouco antes do fechamento das fronteiras do País com a Venezuela, medida tomada em meio à pandemia do coronavírus. Veio com o marido e alguns membros da família dele. Por integrar um grupo de risco da Covid-19, a jovem de 18 anos, que aguarda o primeiro filho, tenta tomar todas as precauções para não ser infectada. E um dos desafios é manter a higiene no local onde vive, uma ocupação informal ao lado do Rio Branco, em Boa Vista, capital de Roraima, com acesso precário a água e saneamento.
A família de Luzmary – prestes a ganhar um novo integrante em cerca de um mês – recebeu um dos 2,5 mil kits de higiene que estão sendo distribuídos pelo UNICEF a famílias de migrantes e refugiados no Estado.
Compostos por sabonetes, escovas e cremes dentais, xampus, lâminas de barbear e absorventes higiênicos, os kits fazem parte das ações do UNICEF para mitigar os impactos da Covid-19 entre as populações mais vulnerável do País. Essa doação, assim como muitas outras, foi possível graças a parcerias com empresas, celebridades, organizações da sociedade civil e governos locais.
“Graças a Deus que aqui estamos conseguindo ajuda. Estávamos passando por extremas dificuldades (na Venezuela)”, conta a jovem, que acredita que terá acesso a um parto seguro para o primeiro filho. Depois, diz, vai poder pensar em como retomar os estudos. Concluído o ensino médio na Venezuela, ela planejava começar a frequentar uma universidade.
Em Boa Vista, os kits de higiene estão sendo distribuídos a famílias que vivem em 15 ocupações espontâneas da cidade. São terrenos e prédios abandonados onde as famílias vivem com pouco acesso a serviços, os que as tornam particularmente vulneráveis à Covid-19.

Outra a receber os produtos de higiene pessoal foi Nataly Guillén, vizinha de Luzmary. Ao contrário da jovem que chegou há poucos meses, Nataly, 35 anos, já está no Brasil há cinco anos. “A maioria das pessoas aqui não tem dinheiro para comprar esses itens de higiene, como sabão e escova dental. Fazem muita falta”, diz ela, que é da área de saúde. Faltava um ano para se formar em medicina quando teve de deixar o seu país devido à deterioração das condições de vida.
Em outra ocupação da cidade, chamada Aprisco, Li Barrios, 36 anos, é exemplo de como a crise venezuelana afetou as famílias. Dos seus quatro filhos, dois estão com ela no Brasil, um está na Colômbia e outro na Venezuela. Ela diz que os kits são uma importante ajuda. “Eu não tinha xampu. E os absorventes são muito importante para a higiene das mulheres. Tudo isso fazia falta”, afirma.

Na sua ocupação, o UNICEF instalou estruturas para lavagem de mãos e caixa d’água, que estão sendo regularmente alimentadas por caminhões cisternas. Assim como a distribuição de kits, essas ações são realizadas por meio de uma parceria com a Agência Adventista de Desenvolvimento e Recursos Assistenciais (Adra).
Já presente em nove ocupações, as estruturas de lavagem de mãos vão chegar a 15 ocupações de Boa Vista, beneficiando cerca de 2,5 mil pessoas. Os kits de higiene estão sendo distribuídos ainda em Pacaraima, região da fronteira com forte concentração de comunidades indígenas, que também migraram no contexto da crise venezuelana.
Crise migratória
O surto da Covid-19 representa uma ameaça adicional à proteção, ao bem-estar e ao futuro das crianças e dos adolescentes migrantes e refugiados. Diante da crise econômica e social da Venezuela, mais de 5 milhões de pessoas já deixaram aquele país desde 2015, incluindo Luzmary, Nataly, Li e suas famílias.
Só o Brasil registrou mais de 264 mil solicitações de refúgio e de residência temporária. Mais de um terço são crianças e adolescentes.
Muitos migrantes, incluindo povos e comunidades indígenas, vivem em condições precárias em ocupações informais ou nas ruas de cidades como Boa Vista (RR), Manaus (AM) e Belém (PA). Na sua resposta a essa crise migratória, o UNICEF foca em mitigar os impactos da Covid-19 para essas populações, além de apoiar o Governo Brasileiro na Operação Acolhida, a resposta oficial do País, em parceria com agências das Nações Unidas e organizações da sociedade civil, no âmbito da plataforma R4V (Resposta a Venezuelanos e Venezuelanas).