Livros, máscaras e proteção: volta às aulas em segurança
Na periferia de São Paulo, a Escola Estadual Brigadeiro Gavião Peixoto está aberta para aulas presenciais e tem tomado todas as atitudes para receber os estudantes de forma segura

Para Estela de Santana, 9 anos, o primeiro dia de aula no 4º ano do ensino fundamental foi melhor ainda depois de ter passado um ano estudando remotamente em casa. “Agora que eu já estou vindo pra escola, é muito mais legal ver meus amigos, amigas e conhecer um pouco mais do professor e de mais matérias”, conta a menina. Em 2020, a Escola Estadual Brigadeiro Gavião Peixoto, onde ela estuda no bairro de Perus, na periferia da Cidade de São Paulo, teve que fechar as portas para seus mais de 2.200 alunos, assim como escolas de todo o País. Após quase um ano de preparação, a escola voltou às aulas presenciais em fevereiro de 2021, cumprindo todos os protocolos de prevenção da Covid-19.
“Eu me protejo do coronavírus na escola, eu passo álcool antes de comer, depois de comer, quando chego à escola, lavo a mão bem direitinho, fico com distanciamento das minhas amigas e do professor”, explica Estela, de máscara.
Esta é a nova rotina dos estudantes. Logo ao chegar, têm a temperatura tomada, já higienizam as mãos e seguem para as salas de aula. As carteiras estão colocadas a 1,5 metro umas das outras e há álcool para limpeza. O professor, além de os livros, agora carrega consigo a máscara e o protetor facial para ministrar a disciplina. Os intervalos recreativos foram todos espaçados e escalonados, evitando aglomeração de estudantes no pátio da escola. A hora do lanche, que antes reunia amigos nas mesas coletivas, agora tem a merenda servida no refeitório, onde faixas indicam os lugares em que os estudantes podem sentar-se para manter o distanciamento.
Para chegar a esse modelo, houve muito planejamento e conversa. Na Gavião Peixoto, o diálogo entre escola, famílias e estudantes foi um fator essencial para a volta presencial.

O caminho para a volta às aulas presenciais
Em 2020, a escola precisou se adaptar para seguir com o ensino de seus estudantes do ensino fundamental, ensino médio e educação de jovens e adultos. Com o tempo, pouco a pouco, foi aprendendo a lidar com a nova realidade do ensino remoto. Criou um site, realizava lives com pais, professores e estudantes em suas redes sociais, mas percebia que muitas crianças e muitos adolescentes ainda ficavam de fora. “O sistema de ensino remoto não é includente. Principalmente na nossa realidade de periferia, em que muitos dos nossos alunos não têm os recursos necessários para esse acesso. E este foi o nosso grande desafio: como alcançar aquele aluno que não tinha o recurso disponível?”, conta Eloísa Tavares, diretora da escola.
Identificando essas dificuldades, a escola decidiu reabrir suas portas gradualmente, ainda em outubro de 2020, funcionado apenas com plantões de dúvidas e professores voluntários. “O Gavião está preocupado com seus alunos”, era o aviso do carro de som que passava pelo bairro, informando que a escola estava de portas abertas para entregar atividades impressas.
Os estudantes que não tinham acesso à internet iam até a escola para receber as atividades e tirar dúvidas com os professores pessoalmente, seguindo os protocolos de distanciamento, máscaras e higienização das mãos. Com isso, professores, estudantes e funcionários começaram a se sentir cada vez mais seguros em reabrir suas portas em 2021. E assim aconteceu, gradualmente.
O professor do 4º ano David Matos precisou adaptar as suas aulas, principalmente agora que a escola tem funcionado em um modo híbrido, e cada semana as turmas são divididas em agrupamentos para que dez estudantes estejam presencialmente na sala de aula, conforme a ordem da lista de chamada. “A diferença da escola hoje são as restrições, porque na faixa etária em que os alunos se encontram eles precisam do contato social, do carinho, do abraço. Dividir lanche, por exemplo, era uma coisa tão simples e que eles não podem mais fazer. O mais difícil é adaptar essas coisas simples que acabaram se perdendo no meio do caminho, e de que eles sentem muita falta, muito mais do que nós professores”, conta.

Um dos desafios do professor tem sido conciliar o ensino remoto com o presencial, para que todos os estudantes recebam o mesmo conteúdo. Porém, ele acredita que a atividade presencial tem ajudado no relacionamento com os alunos. “Infelizmente o contato imediato, aquela intervenção que tem que ser feita no momento da dúvida da criança, a gente não consegue mais sanar [no remoto], só daqueles que estão vindo”, explica.
Maria Eduarda, 10 anos, foi uma das estudantes que quis voltar para a escola presencial. “Eu senti alegria, até porque eu poderia sair de casa de novo e estudar”, diz a menina, também do 4º ano. Durante a pandemia, ela seguiu fazendo as provas da escola, mas não conseguiu acompanhar o conteúdo completo. “Foi difícil [durante a pandemia], porque a experiência de escola online foi novidade pra ela. Ainda está sendo, mas ela prefere muito mais a escola presencial que remota”, conta a mãe, Valdira dos Santos.
Preocupada, a mãe tinha receio de enviar a filha para a aula presencial, e assim como ela, outros pais e responsáveis compartilhavam da mesma preocupação, que foi solucionada com um diálogo entre a escolas e as famílias. “A família teve muito medo de voltar, porque a gente se sente insegura, ela é tudo pra mim, então a gente tem que ter medo”, diz.
Pensando nisso, a escola realizou diálogos sobre a volta presencial com as famílias, para ajudar a solucionar anseios e garantir que os estudantes se sentissem acolhidos. “Fizemos uma reunião de pais online, via Facebook da escola, junto com os professores, para esclarecer o que faríamos, explicar que nesse momento a retomada não era obrigatória, mas que, se o aluno quisesse vir, nós estaríamos aqui de coração aberto. E mostramos imagens da escola, como estavam organizados a sala de aula, os banheiros, o refeitório”, explica Eloísa, a diretora. “Eu acredito que ajudou muito no processo de superação dos medos e das dúvidas da comunidade”, completa.

Além disso, a mãe de Maria Eduarda aceitou o convite da escola para pais e responsáveis e, antes do retorno presencial, foi até lá para verificar o que havia sido feito para prevenção da Covid-19, e se sentiu mais confiante. “Eu sinto que a escola está bem preparada, antes do retorno, eu vim para a escola, falei com a diretora, e me senti mais segura para a volta dela [Maria Eduarda]”, conta Valdira.
Agora, professores, famílias e estudantes trabalham juntos para prevenção da doença no ambiente escolar e, acima de tudo, buscam priorizar o papel essencial da escola na vida das crianças e dos adolescentes, que ficou ainda mais evidente na pandemia. “Eu entendo que isso é algo muito bom, porque a não obrigatoriedade [da volta presencial] não gera o medo. O aluno que vem é porque se sente seguro, porque tem necessidade de estar na escola, muitas vezes por conta da alimentação”, diz Eloísa. “A gente fez dar certo dentro das nossas possibilidades, mas eu entendo que a escola já é um agente social, e na pandemia isso ficou muito mais acentuado. A necessidade de nutrir a comunidade escolar em todos os sentidos, na aprendizagem, no socioemocional, nas condições de vida. A escola se tornou um ponto de referência para os estudantes”, completa.