“Às vezes, penso: será que vou pra escola?”
Lara Ribeiro, de 18 anos, enfrenta desafios em sua experiência com o transporte público para manter sua rotina de estudos

Lara Ribeiro, jovem de 18 anos, moradora da Cidade Tiradentes, relembra uma história que vivenciou no transporte público de São Paulo, capital. “Voltando dos estudos, peguei o ônibus 3064 no horário de pico, lá em Guaianazes. São duas filas no terminal, uma para quem vai sentado e outra para quem deseja ir em pé. Estava na fila de quem vai em pé, era a última. Chegou minha vez e simplesmente não tinha mais espaço. Por ser a última, não podia voltar para o final da outra fila de quem iria em pé. Eu precisava subir no ônibus. Fiz um malabarismo e coube, porém, o motorista não podia abrir a porta senão eu caía. Isso é bizarro”.
Ela é uma das participantes da iniciativa Geração que Move – uma parceria entre o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Fundação Abertis e as organizações Corrida Amiga e Instituto Pombas Urbanas, que visa promover atividades para transformar a realidade de adolescentes e jovens ao engajá-los para impactar a agenda da mobilidade urbana de sua cidade.
Lara passou a problematizar essa e outras experiências no transporte público a partir das discussões promovidas pelo projeto, durante o qual questões como segurança, direitos, acessibilidade, tempo gasto durante o percurso, entre outros fatores, são discutidas para fomentar o pensamento crítico nos 25 adolescentes e jovens que integram a iniciativa.

Morando com os tios no extremo leste da capital paulista, a jovem gasta, em média, cinco horas no transporte público para ir aos locais onde estuda. Ela cursa geografia na Universidade de São Paulo (USP), e design na Escola Técnica de São Paulo (Etec). Seu trajeto inclui, primeiro, ir à universidade localizada na Zona Oeste da cidade, no Butantã e, após chegar à estação de trem, ainda percorre longo caminho. “Pego o trem e vou até a linha amarela [metrô], daí pego mais um ônibus. O trem também é ruim, porém é rápido, já ajuda”. Após assistir à aula, no período da tarde, ela precisa ir até Vila Prudente, para o curso de design. “Queria ser produtiva no transporte público, mas sempre estou no limite”.
A partir dos ensinamentos adquiridos, Lara passou a enxergar que as experiências que ela vive no transporte público são consequências sociais. A distância para conseguir estudar e a superlotação nos ônibus que circulam na periferia são coisas que impactam seu tempo de vida útil. “Às vezes eu tento ser produtiva, porém o tempo no transporte é meu descanso. Houve época que não dormia para conseguir estudar e trabalhar ao mesmo tempo. Sinto raiva por ver diferentes realidades [sociais]. Eu penso, às vezes, "poxa! será que vou pra escola hoje, será que vou pra faculdade hoje?" Porque é cansativo estar dentro do transporte público”.
Lara também faz parte do primeiro Núcleo de Cidadania de Adolescentes local (Nuca CT), fruto das ações da #AgendaCidadeUNICEF na capital paulista. Atualmente mais de 68 mil crianças e adolescentes de até 17 anos vivem na Cidade Tiradentes e enfrentam desafios diários com relação à mobilidade, como superlotação, alto preço da passagem, falta de segurança, ocorrência de violências no transporte público, barreiras invisíveis de discriminação, ausência de sinalização e dificuldades de acesso a oportunidades de desenvolvimento e inclusão socioprodutiva.